Uma das grandes pressões que as mulheres sofrem é a de
serem mães. Dão-nos bonecas desde a mais tenra idade e crescemos ouvindo que
ser mãe é algo que nos completa, que dá razão às nossas vidas. Que temos
instinto materno, pois isso faria parte da nossa natureza. Essa é uma ideologia
profundamente arraigada e por séculos reproduzida. A capacidade biológica de
gerar filhos é entendida como algo que resume a nossa existência e é
transformada em conduta social obrigatória. Essa ideia, da maternidade
compulsória, é uma forma de opressão às mulheres.
Nem toda mulher sonha em ser mãe. A maternidade não pode
ser encarada como uma obrigação e sim como um direito. Assim como deve ser
direito das mulheres terem liberdade sobre seu corpo e suas vidas. De
escolherem serem mães ou não. Infelizmente no nosso país ainda estamos bem
distantes de uma realidade onde as mulheres possam ter essa liberdade e esse
direito garantido. Por um lado não nos é dado o direito de escolher interromper
uma gravidez indesejada e por outro lado quando optamos por termos um filho,
não nos são dadas condições para exercer a maternidade.
O direito de escolha
e a liberdade de decidir ser mãe ou não
Ainda é uma realidade para muitas mulheres a falta de
conhecimento sobre o próprio corpo e acesso a consultas ginecológicas e métodos
anticoncepcionais de forma gratuita. Muitas iniciam a sua vida sexual sem
nenhuma orientação sobre como evitar uma gravidez indesejada ou doenças
sexualmente transmissíveis. E mesmo para as mulheres que têm acesso à tudo
isso, os métodos contraceptivos não são 100% eficazes e sempre há o risco de
engravidar. No Brasil, interromper uma gravidez indesejada é crime.
A criminalização do aborto faz com que essa seja uma das
maiores causas de morte materna, resultando na morte de uma brasileira a cada
dois dias vítima das condições precárias e inseguras de abortamento
clandestino. E mesmo sendo realizados 1milhão de abortos todos os anos no país,
resultando em um verdadeiro problema de saúde pública com 250mil internações ao
ano para tratar complicações decorrentes de abortos mal feitos, a perspectiva é
de piora. Se depender da vontade dos governantes e do congresso nacional,
teremos uma legislação ainda mais restritiva nesse tema.
As mulheres fazem aborto, sendo legal ou não, porque
sempre existirão gravidezes indesejadas. A criminalização só é eficiente para
torná-lo inseguro e pôr a vida das mulheres em risco. Para garantir que as
mulheres tenham direito de escolha, é necessário a descriminalização e a
legalização do aborto no Brasil. Isso deve vir juntamente com uma política de
educação sexual para orientar sobre
nossos corpos e como evitar uma gravidez, bem como o acesso a consultas
ginecologias e a métodos contraceptivos de forma gratuita e sem burocracia.
Nos cobram que
devemos ser mães mas não nos dão condições de sermos.
Para as mulheres que optam serem mães, o cenário é de uma
verdadeira batalha individual contra o mundo enfrentando inúmeras dificuldades
para criar e educar o filho em um país que não nos oferece condições de exercer
a maternidade de forma plena. A maternidade é tratada como responsabilidade
única e exclusiva da mulher e quando algo dá errado, somos culpabilizadas e
punidas socialmente. Para muitas mulheres a gravidez também acaba sendo um
processo solitário pois não são raras as situações onde somos abandonadas pelos
nossos parceiros ao descobrirem que estamos grávidas.
Um outro exemplo infelizmente ainda muito comum dessa
concepção são as violências sofridas pelas mulheres ao longo da gestação e durante
o parto, a violência obstétrica. São inúmeros relatos de tratamento
desumanizado que se expressa através de grosserias e frases ofensivas, maus
tratos e realização de procedimentos médicos sem a autorização da mulher, como
é o caso da episiotomia de rotina e a aplicação de ocitocina artificial. É como
se devêssemos sofrer ou pagar por termos feito algo errado Não a toa uma das
frases mais ouvidas por vítimas de violência obstétrica é a “na hora de fazer
não doeu. Na hora de fazer não gritou”. Passar por situações como essa em um
momento tão delicado como é o parto impacta muito e negativamente a vida das
mulheres.
Depois de nascidos os nossos filhos, começa a preocupação
sobre a licença maternidade e o retorno
ao empregos. Para muitas mulheres
trabalhadoras esse é um verdadeiro pesadelo pois não nos é garantido o direito
à estabilidade no emprego quando engravidamos. E se para as mulheres a licença
maternidade é de no máximo seis meses, o que já é muito pouco, para os homens
ela é de apenas cinco dias. O que
na prática só reforça a ideia de que cuidar do bebê é uma responsabilidade
feminina, da mãe.
Também é uma grande preocupação para as mulheres a creche
para seus filhos. Na maioria das cidades brasileiras
faltam creches públicas e escolas de educação infantil, o que prejudica muito
as mulheres trabalhadoras pois sem creches é muito difícil trabalhar ou
estudar. No Brasil são aproximadamente 10 milhões de crianças foras das
creches. Muitas dessas milhões de mães brasileiras, diante da falta de vagas
nas creches, acabam recorrendo a familiares ou pagam pessoas para cuidar das
crianças de forma que assim elas possam trabalhar.
Quando não conseguem alguém
para cuidar dos filhos, não há outra saída: abandonam o trabalho e o estudo. Isso
além de atingir diretamente o sustento das famílias, acaba inevitavelmente
aumentando a dependência e a vulnerabilidade dessas mulheres. Sem ter emprego,
uma forma de sustento que garanta a independência financeira, muitas mulheres
acabam inclusive não conseguindo sair de relacionamentos abusivos pois não
teriam como sustentar a si e a seus filhos.
Os governos não garantem políticas públicas eficientes
para que tenhamos garantido o direito de ser mãe, caso o desejemos. Faltam
trabalhos dignos e também estabilidade no emprego quando engravidamos. O custo
de vida é muito alto e os salários são baixos, dificultando muito o sustento de
uma família. Faltam creches e escolas para os filhos e filhas dos
trabalhadores, obrigando as mulheres a abandonarem o trabalho e o estudo para
cuidar dos filhos. Faltam moradias para vivermos com nossas famílias. Nossos filhos morrem nas filas dos hospitais
pela falta de vagas ou pelas mãos da polícia nas periferias do país.
Ser mãe deve ser
“padecer” no paraíso?
Acreditamos que as escolhas das mulheres devem ser livres
e respeitadas. A maternidade não deve ser um projeto de vida obrigatório para
as mulheres. Uma mulher que escolha não ser mãe não deve ser condenada. Assim
como não deve ser condenada uma mulher que escolha ser mãe.
Não podemos permitir que mulheres sofram por suas
escolhas. E lutamos para que ser mãe não seja ter que padecer em lugar nenhum.
E mudar essa realidade só é possível com organização e luta das mulheres
trabalhadoras pelo fim do machismo e contra o capitalismo. Esse sistema nunca
dará para nós as condições para exercermos as nossas escolhas de forma plena e
livre pois lucra com o machismo que nos faz sofrer.
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