Por Juliana Melim, do MML ES
Das janelas reais ou das janelas virtuais que agora se abrem com mais frequência para uma parcela da população, assistimos ao crescimento dos contágios e das mortes provocadas pelo novo Corona vírus no Brasil e no mundo. No Brasil, nos aproximamos das 150 mil mortes oficiais. Em sua maioria corpos de mulheres, pretos e pobres.
Dados do Sistema de Informação e Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe), indicam que o Brasil passa de 200 mortes de mulheres grávidas ou no pós-parto por Covid 19. Esse número corresponde a cerca de 70% das mortes de gestantes e puérperas no mundo e fica mais grave ao sabermos que 22,6% dessas mulheres não tiveram acesso a um leito de UTI.
Ser mulher no Brasil é um desafio histórico e cotidiano. O machismo, as desigualdades sociais, a violência, nos pune, nos abandona, nos mata. Sobretudo as mulheres negras. Além de todas essas expressões da exploração e da opressão, a maternidade, por se tratar, muitas vezes, de um papel socialmente imposto, idealizado e romantizado, também se apresenta como um desafio. As possíveis fases do ciclo reprodutivo transformam-se em risco de morte em um país extremamente desigual, machista e racista. O mais preocupante é que a maior parte das mortes maternas possuem causas amplamente conhecidas pela ciência e poderiam, facilmente, serem prevenidas ou tratadas.
Dados do Ministério da Saúde denunciam que entre 2000 e 2017, morreram, oficialmente, 29.983 mulheres por causas maternas. Se observarmos apenas o ano de 2017 identificaremos 1.718 óbitos maternos. Grande parte dessas mortes poderiam ter sido evitadas com a execução e o financiamento públicos de programas e serviços que garantissem acompanhamento pré-natal, assistência e acolhimento adequados combinados com políticas públicas que reduzissem as desigualdades: direito à educação, inclusive à educação sexual - por isso repudiamos todas as tentativas de aprovação de projetos como o Escola sem Partido. Direito ao trabalho protegido, por isso a necessidade de lutarmos pela revogação da “reforma” da previdência, da “reforma” trabalhista, da ampliação da Lei das Terceirizações, que atacam os direitos vinculados ao trabalho e deixam mulheres e homens da nossa classe jogados no desemprego, na informalidade e nos trabalhos cada vez mais precarizados. Direito ao saneamento básico e à política de saúde. Por isso, defender o SUS é uma pauta fundamental.
A maternidade precisa ser uma escolha consciente e livre das mulheres. E, caso se concretize, precisa contar com uma rede de políticas públicas que assegurem a vida da mãe e da criança. Todavia, sabemos que no Brasil a violação e negação dos direitos atingem, especialmente, as mulheres negras, indígenas, pobres, com baixa escolaridade e que, na triste maioria das vezes, possuem pouco ou nenhum acesso aos serviços de saúde. Negam-se exames básicos, consultas de pré-natal, negam um parto “humanizado” e livre de violência obstétrica, negam o acompanhamento da puérpera, negam a possibilidade de decidir interrromper, de maneira segura, a gravidez, quando nos vemos impossibilitadas ou não desejamos ser mães em determinado momento das nossas vidas.
Que possamos escancarar nossas janelas para entender essa realidade e adensar a luta das mulheres trabalhadoras, negando, agora sim, a sociedade dividida em classes e produtora das desigualdades e parindo, com nossas próprias mãos, uma outra sociedade livre de todas as mazelas.
Como enfermeira, professora, pesquisadora em Saúde do Trabalhador E defensora do SUS, me sinto contemplada com esse registro. Essa reflexão me REPRESENTA 👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼
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