# “Mulheres Pretas têm
história” - Manifesto aprovado no encerramento do 1º Seminário Nacional de Mulheres Negras do MML
Nós,
mulheres trabalhadoras negras e não negras, indígenas, quilombolas, camponesas,
trans, lésbicas, bissexuais, haitianas, africanas, cubanas e brasileiras
estivemos presentes ao I seminário de mulheres negras do MML, com o objetivo de
discutir a relação de gênero, raça e classe, resgatando a história de luta e
resistência das mulheres negras.
O
Seminário foi realizado nos dias 23 e 24 de julho, organizado pelo Movimento
Mulheres em Luta, Movimento Nacional Quilombo Raça e Classe e setoriais da
CSP-Conlutas, e contou com a presença de 400 trabalhadoras que reafirmaram: “As Mulheres Pretas têm História. E fazem
História”.
Não
por coincidência, o seminário se realizou no mês das pretas, em que comemoramos
o dia internacional latino-americano e caribenho da mulher negra e o dia da
mulher africana, num momento em que há um ascenso das lutas negras em todo o
mundo.
A
luta classista deve necessariamente ter um recorte de gênero e raça, pois se é
verdade que o machismo é um inimigo mortal das mulheres trabalhadoras, também é
verdade que no caso específico das mulheres negras, o machismo aliado ao
Racismo age violentamente, faz com que suas identidades sejam negadas, furtadas
e violadas pelo sistema.
Lutar
contra o racismo e derrotar a visão de um movimento de mulheres embranquecido
são condições para unificar as trabalhadoras e construir um movimento de
mulheres realmente classista e socialista.
Um
ponto de acúmulo do debate foi a especificidade da mulher negra. Isso
significou debater o que é ser negra: é o reconhecimento da discriminação
carregada de sentido, que vai desde o corpo, a cor da pele e o afastamento de
seu território de origem. As mulheres negras são as únicas que, antes mesmo de serem
identificadas como mulheres, são estigmatizadas pela cor da pele, o que faz com
que sejam desumanizadas. Seu corpo é transformado em objeto hipersexualizado. Identidade
que lhe foi roubada pela dispersão da diáspora, pela escravidão e pelo
submetimento de povos inteiros para favorecer a exploração capitalista.
No
Brasil, as mulheres negras seqüestradas de seus territórios foram imediatamente
submetidas à exploração do modo escravista, elas estão fortemente marcadas por
centenas de anos de submissão à tortura, ao trabalho forçado, a constantes
estupros, à “coisificação”, enfim, desumanização e violação de direitos humanos
e sociais.
A resistência é uma marca das mulheres
negras. A história demonstra que, desde o início da colonização, nós
lutamos contra o sistema opressor capitalista. Nossas lutas se dão na
organização de fugas, na construção de quilombos, em movimentos emancipatórios
etc. À frente dos quilombos, estiveram lideranças como Aqualtune, Teresa de
Quariterê, Dandara, Luisa Mahin. A raiz disso está na nossa ancestralidade
Africana onde as mulheres exerciam o poder na organização social política e
religiosa, eram rainhas, sacerdotisas e guerreiras.
Resgatando
essa história, o Seminário reafirmou a importância de pensar a realização da
identidade da mulher negra de modo coletivo em conjunto com a classe
trabalhadora em contraposição às saídas capitalistas de empoderamento
individual, que não têm servido aos interesses históricos e imediatos da classe
trabalhadoras. Por exemplo, o presidente negro dos Estados Unidos, Barack
Obama, não impediu as inúmeras mortes racistas em Baltimore. Não basta ser
negro, tem que defender a classe trabalhadora.
No
Brasil há um racismo institucionalizado e não há políticas de ação afirmativa consequentes. O governo Dilma (PT), que apoiou os banqueiros, os patrões e o
agronegócio contra nossas quilombolas e indígenas, não respondeu às demandas
sociais das mulheres negras, que continuam na base da pirâmide social, são as
principais vítimas de violência doméstica, sexual, econômica e
psicológica. E o que temos pela frente
com este governo provisório de Temer é um aprofundamento ainda maior contra a
classe trabalhadora negra e pobre deste país. Um dos maiores crimes contra o
povo negro foi a ocupação militar no Haiti, que começou com PT e continua com
Temer.
Para
as mulheres negras a combinação do machismo com o racismo representa, entre
outras coisas, um aumento nos índices de violência, de estupro e assassinatos,
como expressou o mapa da violência contra a mulher. Enquanto os casos de
violência à mulher negra aumentaram 54%, entre as mulheres brancas diminuiu
10%. Por isso afirmamos que a cultura do estupro é resquício da escravidão e
manutenção da cultura da classe dominante. O Brasil também é o país com maior
número de assassinatos LGBTs e, dentro dessa estatística, também estão as
mulheres negras.
Apesar
dos trágicos números, há uma resistência no país contra os ataques do governo e
ela é fortemente negra, feminina e LGBT. As greves da educação, as ocupações de
escola, as lutas quilombolas e as greves operárias, as lutas contra a
lgbtfobia, contra a cultura do estupro, contra a violência policial têm sido
expressão da ação dos trabalhadores em luta contra os ataques. Ao mesmo tempo, os
governos respondem contra-atacando com medidas duras de ajuste fiscal e
controle da classe, como por exemplo a proposta de reforma da previdência por
um lado e por outro o projeto da escola sem partido, que busca calar e
criminalizar profissionais da educação e estudantes, além da lei antiterror,
que visa criminalizar os lutadores.
As
mulheres negras trabalhadoras e de luta não cederam e não cederão à casa grande
e nem aos capatazes. Por isso o seminário expressou um grande sentimento contra
o volta Dilma, pois ela não representou os interesses das mulheres negras
trabalhadoras. Estamos pelo “Fora Temer
e Fora Todos que oprimem e exploram a classe trabalhadora”.
Defendemos a construção de uma grande
greve geral, em defesa dos interesses das mulheres negras e trabalhadoras, por
eleições gerais com novas regras e um amplo processo de aquilombamento das
lutas e da resistência.
Esse
manifesto é pequeno para o tamanho das nossas ideias e para nossos desafios.
Apenas começamos. A próxima tarefa é
compilar todas as propostas que surgiram nos riquíssimos grupos de debate.
Vamos enegrecer o MML fazendo um amplo debate nas suas instâncias e em cada
local onde nos organizamos para estabelecer um forte programa para atuar nas
lutas das mulheres trabalhadoras.
Somos
mulheres pretas construindo história!