Por Juliana Melim, do MML ES
Das janelas
reais ou das janelas virtuais que agora se abrem com mais frequência para uma
parcela da população, assistimos ao
crescimento dos contágios e das mortes provocadas pelo novo Corona vírus no
Brasil e no mundo. No Brasil, nos aproximamos das 150 mil mortes oficiais. Em
sua maioria corpos de mulheres, pretos e pobres.
A ausência de
uma política que implementasse quarentena geral com emprego e renda digna para
toda população, gera nossa indignação frente à atuação do governo Bolsonaro com sua política
econômica ultraliberal e sua postura de negação da ciência e descaso com as
vidas. Nenhuma política séria de enfrentamento aos impactos sanitários, econômicos
e sociais da pandemia. O Estado apresenta, sem máscaras, sua natureza de classe.
No capitalismo, sua natureza burguesa, em defesa dos lucros. Enquanto isso as
mortes aumentam. Números ganham nomes, rostos cada vez mais conhecidos.
Não restam
dúvidas que o contexto de pandemia agravou as desigualdades sociais, raciais,
de gênero e orientação e identidade sexual já tão violentamente desenhadas em
nosso país. No caso das mulheres trabalhadoras o desemprego, o aumento da violência
doméstica e também da violência obstétrica ganham o triste destaque nas
manchetes do mundo.
Dados do
Sistema de Informação e Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe),
indicam que o Brasil passa de 200 mortes de mulheres grávidas ou no pós-parto
por Covid 19. Esse número corresponde a cerca de 70% das mortes de gestantes e
puérperas no mundo e fica mais grave ao sabermos que 22,6% dessas mulheres não
tiveram acesso a um leito de UTI.
Esses dados
trazem ao centro do debate a necessária implementação das políticas sociais
públicas destinadas ao atendimento das mulheres trabalhadoras nas suas mais
diversas demandas sociais. Combater a mortalidade materna exige reflexões e
ações no campo da política, da economia e da cultura. Ações capazes de promover
o atendimento às especificidades das mulheres na sua condição de trabalhadora,
de gestante e, em muitos casos, de mulheres que se encontram com toda
responsabilidade pelos cuidados com os filhos.
Ser mulher no
Brasil é um desafio histórico e cotidiano. O machismo, as desigualdades
sociais, a violência, nos pune, nos abandona, nos mata. Sobretudo as mulheres
negras. Além de todas essas expressões da exploração e da opressão, a
maternidade, por se tratar, muitas vezes, de um papel socialmente imposto,
idealizado e romantizado, também se apresenta como um desafio. As possíveis
fases do ciclo reprodutivo transformam-se em risco de morte em um país
extremamente desigual, machista e racista. O mais preocupante é que a maior
parte das mortes maternas possuem causas amplamente conhecidas pela ciência e
poderiam, facilmente, serem prevenidas ou tratadas.
Dados do
Ministério da Saúde denunciam que entre 2000 e 2017, morreram, oficialmente,
29.983 mulheres por causas maternas. Se observarmos apenas o ano de 2017
identificaremos 1.718 óbitos maternos. Grande parte dessas mortes poderiam ter
sido evitadas com a execução e o financiamento públicos de programas e serviços
que garantissem acompanhamento pré-natal, assistência e acolhimento adequados
combinados com políticas públicas que reduzissem as desigualdades: direito à
educação, inclusive à educação sexual - por isso repudiamos todas as tentativas
de aprovação de projetos como o Escola sem Partido. Direito ao trabalho
protegido, por isso a necessidade de lutarmos pela revogação da “reforma” da
previdência, da “reforma” trabalhista, da ampliação da Lei das Terceirizações,
que atacam os direitos vinculados ao trabalho e deixam mulheres e homens da
nossa classe jogados no desemprego, na informalidade e nos trabalhos cada vez
mais precarizados. Direito ao saneamento básico e à política de saúde. Por
isso, defender o SUS é uma pauta fundamental.
A maternidade
precisa ser uma escolha consciente e livre das mulheres. E, caso se concretize,
precisa contar com uma rede de políticas públicas que assegurem a vida da mãe e
da criança. Todavia, sabemos que no Brasil a violação e negação dos direitos
atingem, especialmente, as mulheres negras, indígenas, pobres, com baixa
escolaridade e que, na triste maioria das vezes, possuem pouco ou nenhum acesso
aos serviços de saúde. Negam-se exames básicos, consultas de pré-natal, negam
um parto “humanizado” e livre de violência obstétrica, negam o acompanhamento
da puérpera, negam a possibilidade de decidir interrromper, de maneira segura,
a gravidez, quando nos vemos impossibilitadas ou não desejamos ser mães em
determinado momento das nossas vidas.
Que possamos
escancarar nossas janelas para entender essa realidade e adensar a luta das
mulheres trabalhadoras, negando, agora sim, a sociedade dividida em classes e
produtora das desigualdades e parindo, com nossas próprias mãos, uma outra
sociedade livre de todas as mazelas.