Por Tamiris Rizzo da Assembleia Nacional dos Estudantes - Livre, a ANEL
O ano é 2012, o dia é 8 de março, Dia Internacional de Luta da Mulher, e sim, precisamos dizer em alto e bom som que o machismo não acabou. Há quem diga que por termos conquistado muitos avanços, como o direito ao voto, a conquista do direito ao divórcio, a entrada da mulher no mercado de trabalho, teríamos acabado com o machismo e a desigualdade entre homens e mulheres sendo essas coisas do passado, afinal quem governa o país é inclusive uma mulher!
Orgulhamos-nos muito de todas as conquistas que foram alcançadas fruto de muita luta de mulheres e homens trabalhadores, mas a ANEL tem um desejo: que nesse dia possamos dizer que a vida das mulheres está longe de ser um mar de rosas, e que nossa situação se confunde com o seguinte dado: a cada 12 segundos uma mulher sofre algum tipo de violência e que a cada duas horas morre ao menos uma mulher no Brasil.
Até o fim dessa leitura, muitas mulheres já terão sido agredidas, e entre essas estatísticas estaremos nós, mulheres jovens, que sentimos na pele as dificuldades impostas por essa sociedade capitalista e machista, que reproduz valores e práticas que são responsáveis por dados como esses e que se concretizam em cenas muito familiares para nós como o medo de voltar sozinha para casa à noite, o assédio que sofremos na rua sendo consideradas objetos, os diferentes tipos de agressões psicológicas, morais e até físicas que sofremos dentro de casa, sejam com nossos pais, irmãos, namorados, e isso sem mencionar o assédio moral e sexual a que estamos submetidas em nosso ambiente de estudo e trabalho.
De acordo com o Anuário de Mulheres de 2011, as mulheres jovens, de 15 a 29 anos, representam cerca de 25 milhões, o que equivale a 25% da população feminina e 13% da população total. Em São Paulo, apenas 7,9% das jovens negras e 10,2% das não negras tem o estudo como única ocupação. As que estudam, trabalham e/ou procuram trabalho são em média 18,9% e 12% apenas cuidam dos afazeres domésticos. Isso mostra que as mulheres jovens, em sua maioria, não estão nas escolas e universidades e sim já inseridas ou na tentativa de inserção no mercado de trabalho. E uma parcela significativa delas ainda está presa somente ao trabalho doméstico.
Tomando como base esses dados podemos dizer que a situação das mulheres jovens é ainda muito preocupante, uma vez que boa parte ainda não tem direito à educação e desde muito cedo somos obrigadas a entrar no mercado de trabalho para sustentar nossas famílias, e ainda assim ganhando menos que os homens pela mesma função, acumulando o trabalho doméstico, e quando muito, ainda tentamos nossa entrada nas universidades no período noturno.
A mulher jovem na universidade
Desse número reduzido das jovens que conseguem garantir seu acesso à educação, sabemos que muitas de cara já terão um novo desafio: criar mecanismos para poder prosseguir na escola ou universidade, uma vez que o que foi dito acima deixa claro que não temos o direito de escolher entre trabalho/estudo e afazeres domésticos.
Assim, a luta por políticas de permanência estudantil específicas para nós é essencial para que possamos concluir nossos cursos, entre elas está a garantia da moradia estudantil segura; creches na universidade; políticas de segurança e iluminação nos campi universitários; uma vez que muitos são escuros, possuem muitas árvores, falta guarda feminina treinada; bolsas e estágios de acordo com a demanda; serviços como bandejão, bibliotecas, etc. É na garantia de serviços que respondam a complexidade de fatores a que estamos expostas, que acabam abarcando a necessidade da proteção da nossa vida e de podermos baratear nosso custo na universidade, que poderemos evitar o trancamento de nossos cursos e a ida forçada ao mercado de trabalho. Educação de qualidade se faz sem opressão e garantindo condições a todas!
Direito de Decisão: Da nossa identidade, sexualidade e do nosso corpo, não abrimos mão!
A inferiorização e infantilização das mulheres, a visão de que somos propriedades públicas, que somos um amplo mercado em disputa, e que por isso devemos seguir determinados padrões estéticos, morais e de comportamentos tem nos cobrado um preço muito alto. Não é a toa que o capitalismo através do machismo tem ditado “regras” cada vez mais rígidas que geram o adoecimento das mulheres jovens, por não atingirem os ideais de beleza tão lucrativos para as indústrias, ou ainda gerando distorções em sermos avaliadas constantemente por exercer o avanço que tivemos no terreno da sexualidade, afinal a culpa é nossa por usar mini saia e ser estuprada, ou ainda não termos o direito de decidir sobre o que fazer com nosso próprio corpo.
O direito de decisão sobre a maternidade: Creches públicas e Legalização do aborto gratuito e seguro.
Lutamos para que as mulheres jovens possam ter o radical direito de decidir sobre sua sexualidade e dentro de um dos aspectos de sua sexualidade, se querem ou não exercer a maternidade, se o quiserem, devem ter totais condições para isso e se não o quiserem também.
De acordo com listagem divulgada em 2009 pela Associação das Unidades Universitárias Federais de Educação Infantil – ANUUFEI, das 56 Universidades Federais apenas 17 possuem creche, sendo que 6 estão no nordeste, 1 no centro-oeste, 7 no sudeste, 3 no sul e nenhuma no norte. Em relação à moradia universitária, praticamente todas as que existem não aceitam mais as estudantes quando estas engravidam, ou seja, mesmo com o discurso de que a maternidade é algo “natural” a todas as mulheres não vemos que esse discurso se materializa na prática e mais uma vez, a criação de um filho continua sendo papel exclusivo das mulheres, que devem desistir do estudo para exercer seu direito a ser mãe.
O contrário também é verdade. O aborto é realizado por 1 milhão de mulheres todos os anos, dessas 150 mil morrem ou ficam com seqüelas graves; de acordo com a Pesquisa Nacional de Abortos (PNA), dentre as mulheres até 40 anos, uma a cada cinco já fez algum aborto. Nas jovens, entre 18 e 19 anos, uma em cada 20 também realizaram; é uma prática que extrapola as questões religiosas, pouco menos de dois terços das mulheres que fizeram aborto são católicas, um quarto protestantes ou evangélicas, e menos de um vigésimo, de outras religiões. O Código penal brasileiro prevê de 1 a 3 anos de prisão para as mulheres que decidirem que não desejam carregar em seu próprio ventre um feto e ter que enfrentar no futuro todas as dificuldades relacionadas a ter um filho numa sociedade em que somos responsáveis quase que integralmente por eles e o estado se exime de qualquer responsabilidade. Cabe uma pergunta: É certo que por decidir sobre seu próprio corpo e realizar um aborto essas 1 milhão de mulheres sejam presas, sofram seqüelas, ou até morram?
O governo Dilma, acaba de editar a MP 557 para, supostamente, “combater a mortalidade materna”, que tem como sua principal causa o aborto clandestino. Ao invés de solucionar um problema de saúde pública garantido o aborto gratuito e seguro, já aprovado em vários países, o governo brasileiro que tem a frente uma mulher, pretende criar um cadastro nacional de gestantes, no intuito de rastrear e avançar na criminalização da prática do aborto, somado a essa ofensiva está a criação do Estatuto do Nasciturno. Na prática, o aborto continuará a ser realizado nas piores condições para as mulheres trabalhadoras, e o lucro das grandes clínicas privadas será fortalecido pelas mulheres que podem pagar por ele, o serviço de saúde continuará gastando mais tendo que cuidar das seqüelas dos abortos clandestinos, e acima de tudo isso, nós mulheres continuaremos não podendo decidir sobre o nosso maior bem que é nossa vida e a nossa decisão sobre o nosso corpo, onde até um feto tem sua “opinião” mais reconhecida do que a nossa. Exigimos educação sexual para decidir, anticoncepcionais livres e gratuitos para não engravidar e aborto legal para não morrer.
Não basta ser mulher: Dilma e as mulheres jovens e trabalhadoras.
Nós da ANEL, achamos que não basta ser mulher para defender o interesse das mulheres jovens e trabalhadoras. Vimos ao longo do governo Dilma as expectativas das mulheres sendo pouco ou nada atendidas. Em pouco mais de um ano, cerca de 105 bilhões foram cortados do orçamento para investimentos em saúde, educação, moradia, transporte, e por sermos parte do setor mais explorado e que dependem dos serviços públicos, quem mais sofre com isso são as mulheres!
Sem investimento, não conseguimos aumentar o acesso das mulheres na educação e sua permanência. Com o novo Plano Nacional de Educação, mais 20 anos de atraso no investimento em educação estão em jogo, e com certeza quem pagará o preço são as mulheres, que além de sofrem com uma educação sucateada, não terão como garantirem sua permanência, pois não teremos a construção de moradias, creches, bandejão, bolsas.
A Lei Maria da Penha é um grande avanço, no entanto o que vimos foram cortes sucessivos para as secretarias de combate à violência contra a mulher. Ora, como podemos continuar ampliando a lei e garantindo sua aplicação se são cortados os investimentos? Como nos sentir seguras para denunciar nossos agressores se não temos delegacias de mulheres suficientes e casas de abrigo que atendam essa demanda? Devemos denunciar e ficar sobre o mesmo teto sob ameaça de morte? Exigimos que Dilma governe para as mulheres jovens trabalhadoras que tanto criaram expectativas em seu governo e que tenhamos políticas públicas que de fato atendam com investimento às nossas necessidades.
É a ANEL contra opressão: Abaixo o machismo e exploração.
Estamos desenvolvendo em todo país atividades na semana do dia 8 de março, que reflitam parte dessa discussão expressa neste texto e queremos deixar o recado de que somente a luta das mulheres e dos homens trabalhadores pode arrancar do governo as conquistas que tanto precisamos.
O capitalismo transforma nossas diferenças em desigualdades para melhor explorar o conjunto, jogando homens contra mulheres, heterossexuais contra homossexuais, brancos contra negros, criando mecanismos que incentivem a nossa opressão nas salas de aula, nas festas, nos trotes, na rua, dentro de casa, e toda essa prática só nos afasta de nos entendermos como parte de uma mesma classe que é explorada e oprimida todos os dias.
A ANEL tem orgulho de estar na linha de frente contra às opressões, e de construir um movimento estudantil autônomo e combativo que não se distancia em nenhum milímetro da luta pelo fim de qualquer forma de opressão.
Queremos nesse 8 de março outras rosas… As rosas que plantaram as operárias têxteis da Rússia, as rosas que plantaram Dandara, Frida Kalho, Pagu, Clara Zetkin, Rosa Luxemburgo, e também as rosas vivas, vermelhas e intensas que as mulheres do Pinheirinho plantaram e que com certeza florescerá em todos os terrenos a partir de nós!
Viva a luta das mulheres jovens e trabalhadoras!
Fonte: anelonline.org
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