Marcela Azevedo, do
Movimento Mulheres em Luta e da Executiva Nacional da CSP Conlutas
No último dia 28 de
Março, a ministra do Supremo Tribunal Federal – STF, Rosa Weber, solicitou ao
presidente Temer que se manifestasse quanto à legislação brasileira que
criminaliza a prática de aborto. Essa legislação, datada da década de 40 do
século passado, prevê pena de reclusão de 1 a 3 anos para quem praticar o
aborto e pena de 1 a 4 anos para quem provocar aborto em gestante. As exceções
são apenas em caso de fetos anencéfalos, risco de morte para a mulher e casos
de violência sexual.
A solicitação aconteceu
por conta do pedido de liminar (decisão
provisória) feita pelo PSOL e pelo Instituto Anis – organização não
governamental (ONG) de defesa dos direitos das mulheres – para que sejam suspensas todas as prisões em flagrante, os
inquéritos policiais, processos em andamento e efeitos de decisões judiciais
que tenham relação com procedimentos abortivos praticados nas 12 primeiras
semanas de gestação. A ação reivindica ainda a descriminalização do aborto
praticado nesse período.
Temer, inimigo das mulheres
Mais
uma vez, Temer evidencia seu machismo e desprezo pela luta das mulheres. Já não
bastasse a declaração patética do 08 de Março, na qual o presidente exaltou o
papel das mulheres na sociedade, cuidando dos filhos e da casa, e reconheceu o
nosso papel na economia ao sermos excelentes para fiscalizar preço dos produtos
nos supermercados, ele afirma agora que a legislação brasileira referente ao tema
do aborto está adequada e que não é do estado e das leis a responsabilidade
pelas mortes de mulheres vítimas de abortos mal feitos.
Em
2015, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) fez pela
primeira vez uma estimativa sobre os casos de abortos praticados no país. De
acordo com a pesquisa, mais de 8,7 milhões de
brasileiras com idade entre 18 e 49 anos já fizeram ao menos um aborto na vida. Destes, 1,1 milhão de abortos foram
provocados.
A
prática do aborto inseguro atinge diretamente as mulheres negras e pobres.
Dados levantados pelo IBGE apontam que no Nordeste, por exemplo, o percentual
de mulheres sem instrução que fizeram aborto provocado (37% do total de
abortos) é sete vezes maior que o de mulheres com superior completo (5%). Entre
as mulheres pretas,
o índice de aborto provocado (3,5% das mulheres) é o dobro daquele verificado
entre as brancas (1,7% das mulheres).
Segundo
a organização mundial de saúde, a cada dois dias uma mulher morre vítima de
aborto clandestino no país, configurando-se na 5ª causa de morte materna em
solo brasileiro. Ao mesmo tempo em que é sabido que somente em São Paulo
existem cerca de 1500 clínicas clandestinas que oferecem procedimento rápido,
seguro e discreto para mulheres que podem pagar pela segurança de sua vida.
Esses
dados deixam evidente que o tema do aborto é uma questão de saúde pública no
Brasil, portanto é sim de responsabilidade do Estado e do legislativo primar
por condições de garantia a vida dessas mulheres. Outra coisa é se essas
instituições tem interesse em assumir essa responsabilidade. Infelizmente,
sabemos que não.
Direitos não se negociam!
Não
é de hoje que a pauta da descriminalização e legalização do aborto vem sendo
tratada como moeda de troca em negociatas parlamentares. Mesmo o PT, que esteve
no movimento de mulheres atuando por anos em defesa dessa bandeira, logo que
assumiu a presidência, no primeiro mandato de Lula já se comprometeu com a
bancada religiosa e conservadora a não tratar de avançar em temas polêmicos
como esse.
Dilma
seguiu o mesmo caminho e, no momento em que as mulheres estavam nas ruas
lutando para derrubar o projeto 5069/13 de Eduardo Cunha que restringia ainda
mais o direito a interrupção da gravidez no Brasil e reforçava a criminalização
das mulheres, ela tentava um acordão de defesa mútua no qual ele não aprovava o
processo de impeachment e ela não facilitava as investigações sobre o
envolvimento do deputado nos esquemas de corrupção. Sobre a luta das mulheres,
nenhuma palavra.
Quanto
a Temer não há o que esperar de diferente. Um governo que começou sem nenhuma
mulher nos ministérios, que manteve a decisão tomada no final do governo Dilma
de seguir com a secretaria de política para as mulheres como uma pasta dentro
da secretaria de direitos humanos, que cortou 61% do orçamento de políticas de
atendimento às vitimas de violência machista e que tenta a todo custo aprovar
as reformas da previdência e trabalhista que vão aprofundar ainda mais as
desigualdades colocadas para as mulheres trabalhadoras na sociedade, já provou
que é nosso inimigo de gênero e de classe.
Esse congresso corrupto não tem moral para
decidir sobre nossas vidas!
O
STF também solicitou pronunciamento do senado e da câmara dos deputados sobre o
tema. A manifestação ainda não aconteceu, mas já temos indícios do que virá. No
ano passado, quando o STF deu parecer favorável a libertação de pena de cinco
funcionários de uma clinica clandestina de aborto, por entender que a
criminalização da interrupção da gravidez até o 3° mês de gestação fere a
constituição e os direitos democráticos das mulheres, logo o presidente da
câmara Rodrigo Maia (DEM/RJ) criou uma comissão especial para tentar rever a
posição do supremo.
Michel
Temer, Rodrigo Maia, Eduardo Cunha, Jair Bolsonaro e todos os representantes da
“moral e bons costumes” que estão no congresso já demonstraram suas opiniões
sobre a luta por igualdade travada pelas mulheres. Os mesmos que exigem comportamento
recatado das mulheres são os que incitam e praticam a violência e que estão
envolvidos até o pescoço na lama da corrupção. Nenhum deles nos representam,
tão pouco podem decidir sobre nossas vidas.
É preciso descriminalizar e legalizar o
aborto no Brasil
Embora
a decisão tomada pelo STF, no caso do Rio de Janeiro, tenha sido importante por
que abriu precedência para outros julgamentos e ações como essa movida pelo
PSOL e pelo Instituto Anis. Contudo, é valido lembrar que os beneficiados nesse
parecer foram os funcionários da clínica particular, que certamente lucrou
milhões à custa do desespero e sofrimento de mulheres.
No
último período, alguns casos gritantes expuseram a reprodução do machismo e da
naturalização da violência também no judiciário. A libertação do goleiro Bruno
que mandou matar e sumir com o corpo de sua namorada porque não queria pagar
pensão ao filho; a absolvição de Adair Pinheiro, ex-prefeito de Coari/AM, por
que o seu crime de exploração sexual de menores não foi considerado crime de
violência, a transferência da ex primeira dama do Rio de Janeiro, Adriana Anselmo,
para prisão domiciliar para cuidar dos filhos, enquanto milhares de mulheres
pobres e negras perdem seus filhos até para adoção quando estão encarceradas, apontam o caráter sexista e de classe que a
justiça brasileira assume.
Por
isso, não temos nenhuma dúvida de que a garantia dos nossos direitos não passa
pela boa vontade ou empenho de nenhuma instituição burguesa, nem o parlamento,
nem o judiciário vão substituir a nossa ação direta, de construir manifestações
e nos organizarmos para exigir condições de vida e de sobrevivência dignas, assim
como a liberdade para decidir sobre a maternidade.
O
Brasil passa por um momento de grande efervescência das lutas, o conjunto dos
trabalhadores está disposto a fazer uma greve geral para barrar os ataques do
governo e colocar para fora o próprio governo Temer e seus aliados. Nós,
mulheres, somos parte dessa luta, construímos a primeira das grandes
manifestações que aconteceu em Março, o 8M. Fomos também presença forte nas
mobilizações do dia 15 e 31, e devemos seguir dedicando toda nossa garra e disposição
de resistência para construir essa greve geral, em unidade com os homens de
nossa classe, incorporando no corpo das reivindicações as nossas bandeiras
históricas:
·
Por igualdade de condições e direitos!
·
Salário igual para trabalho igual!
·
Pelo fim da violência machista!
·
Mais investimento nas políticas de combate a
violência machista!
·
Educação sexual e anticoncepcional para não
engravidar. Aborto livre e seguro para não morrer!
·
Contra a reforma da previdência e trabalhista! Fora
Temer, fora todos os machistas e exploradores!
'-' Aborto num devia ser legal
ResponderExcluirMsm o corpo sendo da mulher -'ainda é outra vida em questão e se o pai? Quiser o filho?