No dia 1º de agosto, a presidenta Dilma Roussef sancionou o
PL 03/2013, que trata do atendimento integral e obrigatório às pessoas em
situação de violência sexual. Esse projeto de autoria de Iara Bernardi, elaborado
em 1999, discorre sobre todas as esferas de atendimento que os hospitais e
demais órgãos públicos devem realizar para as pessoas que sofrerem algum tipo
de violência sexual. As mulheres são os maiores vítimas dessa realidade,
portanto, é uma medida de forte interesse das mulheres trabalhadoras, que por
sua vez são as que estão mais submetidas ao estupro e à violência sexual e são
as menos assistidas pelo Estado.
Diante dessa sanção, desenvolveu-se uma grande polêmica em
torno do projeto em função de um artigo que prevê a “profilaxia da gravidez”,
ou seja, medidas preventivas para que não se decorra a gravidez indesejada por consequência
do estupro. Essa medida seria a “pílula do dia seguinte”, já permitida no
Brasil e com conteúdo químico cientificamente comprovado de que não se trata de
uma pílula abortiva.
Os setores mais conservadores do Congresso Nacional,
identificados como a bancada evangélica, fizeram um verdadeiro alvoroço com
esse projeto, alegando que ele estaria legalizando o aborto no Brasil. Uma
verdadeira tempestade em copo d’água, uma vez que o projeto de lei da câmara
não chega nem perto de defender a legalização do aborto. Essa postura revela
mais uma vez a que ponto chega o reacionarismo e conservadorismo, que se irrita
com qualquer medida que se identifique minimamente com mais direitos para as
mulheres, mesmo quando se trata de pretensamente proteger as mulheres que
sofrem um crime bárbaro como o estupro.
O PLC 03/2013 parte de uma preocupação correta, a de que
deve haver atendimento obrigatório e integral a qualquer pessoa que sofra
violência sexual, atendimento médico, psicológico, psicossocial, etc. No
entanto, a efetivação dessas medidas só são possíveis se houver uma melhoria
qualitativa nas condições dos hospitais públicos brasileiros, desde o ponto de
vista de sua infraestrutura até a preparação de profissionais especializados
nesse terreno. Isso demanda uma revolução no montante de investimento público na
área da saúde, reivindicação muito apresentada nas manifestações, combinada com
o questionamento sobre a prioridade diante da Copa em detrimento dos hospitais
públicos com qualidade. Essa previsão orçamentária não é garantida pelo
projeto.
Mas o PLC 03/2013 tem outra limitação importante. Para que
as mulheres sejam realmente amparadas após um trauma de violência sexual, é
fundamental que o aborto seja legalizado no Brasil. Afinal, muitas mulheres
procuram formas de realização do aborto por vias clandestinas e inseguras, o
que as submete a mais riscos, para além da violência sexual sofrida. Além disso,
muitas mulheres não buscam ajuda médica e/ou jurídica, mas depois buscam uma
forma de interromper a gravidez e também se submetem a condições inseguras.
Não nos é novidade que este tema não seja tratado no PLC
sancionado pela presidenta. Desde sua campanha eleitoral, Dilma se comprometeu
com os setores conservadores de que não alteraria a legislação relativa ao
aborto no Brasil. Durante a Cúpula dos Povos, Dilma articulou, junto a Michelle
Bachelet, então responsável pela pasta ONU Mulheres, a retirada da frase da
declaração da Cúpula que se referia à luta por direitos reprodutivos das
mulheres e justificou que estava atendendo a uma reivindicação do Vaticano.
Toda essa postura deve despertar conforto da bancada evangélica
e não reações adversas. O movimento de mulheres é que deve se levantar contra
esses retrocessos e com isso vai enfrentar um setor altamente reacionário e
conservador, a bancada evangélica, cuja expressão principal é Marco Feliciano.
E nessa luta, também teremos de enfrentar a traição de antigas lutadoras da
causa das mulheres, que ao assumirem o governo e para manter a governabilidade,
deixam de lado reivindicações muito caras à vidas das mulheres trabalhadoras.
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