quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Quem lucra com o machismo?




                          Por Tawnne de Andrade, professora de História de São Paulo e militante do MML,

Quem será o homem mais rico do Brasil? Podemos procurar na lista da Forbes de 2014 que reúne os 150 bilionários brasileiros detentores de um total de R$ 643,6 bilhões. Certamente pensamos em figuras como os grandes banqueiros, como Joseph Safra (2º lugar), donos de grandes construtoras, como Marcelo Odebrecht, a família Marinho dona da Rede Globo. Não estamos enganados, todos eles estão nessa lista.

Mas o vencedor, com R$ 14 bilhões a mais que o 2º colocado, é Jorge Paulo Lemann[1], principal acionista da Ambev, com uma fortuna de R$ 49,85 bilhões (o equivalente a mais de 63 milhões de salários mínimos). E seus dois principais sócios também figuram na lista de bilionários em 3º e 4º lugar.

A Ambev é dona de nada menos que 22 marcas de cerveja[2], entre elas: Antarctica, Bohemia, Brahma, Budweiser, Stella Artois, e a Skol, que segundo o site da própria Ambev é ‘ líder do mercado brasileiro e a quarta cerveja mais vendida do mundo’.

Semana passada a Skol teve que refazer às pressas sua campanha publicitária para o Carnaval, porque duas ativistas feministas começaram uma campanha nas redes sociais contra os cartazes da Skol que diziam frases como: “Esqueci o ‘não’ em casa” e “Tô na sua seja qual for a sua”. "A 'maravilhosa' Skol decidiu fazer uma campanha de Carnaval espalhando frases que induzem a perda do controle. 'Topo antes de saber a pergunta', 'esqueci o não em casa' são alguns exemplos. Uma campanha totalmente irresponsável, principalmente durante o Carnaval que a gente sabe que o índice de estupro sobe pra caramba", disse na internet Pri Ferrari, publicitária que iniciou a campanha tirando fotos que completavam o cartaz de ‘Esqueci o não em casa’ com ‘e trouxe o nunca’.

 

Depois disso a Skol refez sua campanha, trocando os cartazes para outros com dizeres como:  "Tomou bota? Vai atrás do trio", "Quando um não quer, o outro vai dançar", todos com o slogan “Neste Carnaval, respeite”.
Não estamos impressionadas, e não achamos que os administradores e publicitários fizeram isso por se sentirem responsáveis pelo incentivo ao estupro, sabemos que só trocaram a campanha porque perceberam a repercussão negativa que poderia afetar suas vendas e resultar num boicote à marca na época em que mais se consome cerveja no ano.

Esse não é o único exemplo de propaganda machista, há infinitos exemplos promovidos pela própria Skol e por praticamente todas as marcas de cerveja. Alguns exemplos de campanhas dos últimos anos da Skol incluem um comercial de um casamento em que o homem pergunta se a noiva vai ‘continuar gostosa pra sempre’ e desiste de casar porque só a Skol continua gostosa pra sempre, há um excesso de imagens de mulheres semi-nuas, em ‘posições sensualizantes pra provocar o imaginário’, e alguns anos atrás também foi criado o aplicativo ‘Garota do tempo Skol’, em que uma sensual mulher loira de biquíni fazia a  previsão do tempo e mandava beijinhos para o usuário do aplicativo.







As propagandas e as ideologias

Alguns podem dizer que as propagandas sempre foram assim e que toda propaganda de cerveja utiliza esses elementos, não precisamos nem comentar os casos da cerveja Devassa. Aqui nos deparamos com vários problemas dessa lógica tão aceita e difundida atualmente: a manipulação e as ideologias que as propagandas defendem e fortalecem na sociedade, o excesso de propagandas a que estamos submetidos, e a naturalização das opressões que essas propagandas promovem. Tudo isso com o único objetivo de incentivar o consumo excessivo de certos produtos.

Hoje é impossível escapar das propagandas, a cidade de São Paulo, por exemplo, há alguns anos tem uma lei que proíbe os outdoors, o que em nada impede que tenhamos comerciais sendo anunciados: nas televisões instaladas em ônibus e metrôs do sistema público de transporte, o caso do metrô é incrível, já que todos os vagões tem cartazes colados na parte interna e alguns na parte externa, os novos pontos de ônibus instalados pela prefeitura também vieram acompanhados de painéis próprios para colocar propagandas, como foi o caso desses cartazes da Skol onde as ativistas fizeram o protesto.

Na internet também somos bombardeados com propagandas dentro do Facebook, nas nossas caixas de e-mail, e antes de assistir qualquer vídeo no Youtube. As próprias redes sociais mapeiam nossos interesses para noticiar propagandas devidamente voltadas para nosso perfil. Nunca reparou nisso? Faça a experiência e digite num site de busca como o Google qualquer tipo de produto para pesquisar preço, depois perceba que quando estiver navegando em qualquer outro site sobre outro assunto as propagandas serão justamente sobre aquele produto.

As propagandas décadas atrás surgiram ‘inocentemente’ para divulgar e informar a existência de certos produtos e suas qualidades, mas há muito tempo o capitalismo ampliou essa função, e hoje as propagandas servem para difundir na sociedade determinados valores e idéias que estão de acordo com o que os grandes proprietários dessas marcas querem que as pessoas pensem.

Ou seja, a propaganda não vende só um produto, ela vende uma visão de mundo. A propaganda de cerveja quando é machista não está só tentando vender uma cerveja e ‘sem querer comete um erro de ser machista’. A propaganda é machista de propósito porque vende junto com a cerveja a ideia de que o homem que consome aquele produto se torna mais poderoso com as mulheres. A mulher no comercial não é uma pessoa, é um simples objeto sexual, de acordo com os desejos do homem, já que ela não possui vontade própria.
E é com essas ideias embutidas no produto, que monopólios como a Ambev conseguem lucrar tanto, como por exemplo entre julho e setembro de 2014, tiveram uma receita líquida de R$ 8,624 bilhões[3].

E o investimento dos governos em segurança das mulheres?

Segundo site Sala de Imprensa Dilma, sobre “o lançamento do programa Mulher Viver Sem Violência. O programa conta com investimentos da ordem de R$ 305 milhões e tem o intuito de fortalecer a rede de serviços especializados de atendimento às mulheres em situação de violência[4].” Se considerarmos que a população atual de mulheres no Brasil supera 100 milhões, o governo está investindo apenas R$ 3,00 em cada uma de nós. Num país com mais de 5.000 municípios há apenas 500 delegacias da mulher. O Movimento Mulheres em Luta reivindica do governo federal um investimento mínimo que corresponda a 1% do PIB (Produto Interno Bruto).

Já no site do governo do estado de São Paulo sequer é possível encontrar informações sobre segurança da mulher, já que todas as matérias tratam do tema segurança de forma generalizante. A maior cidade do país, com uma população de cerca de 5 milhões de mulheres possui apenas 9 Delegacias da Mulher e 1 hospital especializado em casos de violência, o Pérola Byington (consulte e anote o endereço da delegacia mais próxima[5]).

No Brasil em 2013 foram registrados pela polícia mais de 50 mil casos de estupro, sendo que a estimativa é que apenas 35% dos casos sejam denunciados, o que pode elevar esses números para mais de 143 mil. Só no estado de São Paulo foram mais de 12 mil casos[6].
Neste Carnaval, por exemplo, uma adolescente de 13 anos foi estuprada por 9 homens, entre adultos e adolescentes[7]. É um caso brutal, assustador, nojento. Infelizmente há muitos outros que podem não ter sido denunciados.

Só a luta das mulheres e homens da classe trabalhadora contra o capitalismo, a burguesia e os governos que os servem pode acabar com isso. Por uma sociedade socialista, sem exploração e sem opressão!

Notas:

[1] Conforme em: http://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2014/08/27/lemann-e-o-mais-rico-do-brasil-pelo-2-ano-seguido-aponta-forbes-brasil.htm

[2] Disponível em http://www.ambev.com.br/nossas-marcas/cerveja/

[3] Disponível no site da revista Exame em 31/10/2014: http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/lucro-liquido-consolidado-da-ambev-sobe-23-no-3o-trimestre

[4] Notícia de 10/10/2014, disponível em: http://www.saladeimprensadilma.com.br/2014/10/10/governo-dilma-atua-no-combate-a-violencia-contra-as-mulheres/

[5] Endereço das Delegacias da Mulher na cidade de São Paulo: http://www.cidadao.sp.gov.br/servico.php?serv=1715

[6] Notícia de 11/11/2014: http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2014/11/11/pais-tem-50-mil-pessoas-estupradas-por-ano-roraima-lidera-ranking.htm

[7] Notícia em: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/02/1590631-nove-sao-presos-por-suspeita-de-estupro-de-jovem-de-13-anos-em-osasco.shtml

3 comentários:

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Chega da violência contra as mulheres!

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