Artigo de Priscila Souza de Carvalho e Patrícia Vieira Trópia
“(...) o Brasil governado por
Dilma, primeira mulher eleita presidente em nossa história, está longe de
defender políticas que atendam realmente as necessidades das mulheres. “Não
basta ser mulher, é preciso ter um programa que defenda a classe”, Ana Pagamunici, integrante do MML. CSP-Conlutas, 2012).
O depoimento de Pagamunici coloca em evidência um dos
principais objetivos do Movimento das Mulheres em Luta (MML): politizar a
mulher trabalhadora.O horizonte político do MML não se restringe a incorporar as
mulheres aos sindicatos e aos movimentos sociais,mas torná-las protagonistas
nas lutas de sua classe de origem[3]. Enquanto movimento, propõe a articulação das bandeiras e
das pautas das mulheres a um programa político mais amplo.
A trajetória do MML se inicia em 2003, durante o processo de
mobilização e organização da frente de sindicatos e movimentos populares que
compuseram a Coordenação Nacional de Lutas. Naquela ocasião, o debate em torno
da opressão, da exploração e das desigualdades vividas pelas mulheres trabalhadoras
esteva em pauta. Esta pauta das mulheresfoi inicialmente construída por meio de
um Grupo de Trabalho de Mulheres (GT Mulheres) que se articulava aos outros GTs
temáticos responsáveis pela elaboração de uma agenda política classista.
Em 2006 quando é aprovada a transformação da Coordenação Nacional
de Lutas em central sindical, o GT Mulheres inicia um processo de mobilização e
organização do I Encontro das Mulheres da
Conlutas que ocorreria dois anos depois, de 19 a 21 de abril de 2008, quando
seriam debatidas as posições políticas das mulheres que seriam levadas para o I Congresso da Conlutas – em julho de 2008
na cidade de Betim. Neste momento mais de mil participantes de todo o país
debateram sobre os rumos de sua organização:manter-se-iam organizadas enquanto
um Grupo de Trabalho (GT) ou criariam um movimento de mulheres, afirmando-se
como movimento popular e articulado à nova central? Venceu a segunda proposta.
Na plenária final deste I Encontro foi
aprovada uma pauta ampla, em grande medida herdeira de históricas bandeiras:
trabalho igual salário igual; legalização do aborto; contra a violência sexista,
pela construção de mais creches. Tais bandeiras eram acrescentadas aos eixos de
luta da própria Conlutas: contra as reformas neoliberais que atingiam as
mulheres mais brutalmente, a exemplo da reforma trabalhista que ameaçava o direito
à licença maternidade ou ainda a reforma da previdência, que equiparava tempo
de contribuição entre homens e mulheres ignorando a dupla e tripla jornada de
trabalho(Movimento de Mulheres em Luta, 2008).
Lançado o Movimento Mulheres em Luta, de caráter classista e socialista, ele se
constituía como alternativa para as mulheres trabalhadoras, propunha a
organização de reuniões de mulheres nos locais de trabalho e a construção das
pautas de reivindicação das trabalhadoras, priorizando a auto-organização. O
MML se filiou e participou do I Congresso da Conlutas em julho de 2008,buscando garantir, além da
incorporação de suas reivindicações, a realização de um novo Encontro. Era
fundamental para as militantes do MML
disseminar a pauta feminista no interior da Conlutas e manter viva sua
organização.
O II Encontro de
Mulheres da Conlutas ocorreu em 2010, dois dias antes do CONCLAT (Congresso
Nacional da Classe Trabalhadoras)[4].
O contexto deste segundo Encontro era o debate em torno da unificação da CSP
Conlutas e da Intersindical para a construção de uma nova central sindical. O MML buscou garantir, no debate sobre a
unificação, a participação dos movimentos de luta contra a opressão. A questão interna, voltada ao tema político
organizativo, foi a eleição de uma executiva nacional,
cujo papel seria implementar as deliberações dos encontros das mulheres de modo
a avançar na organização do movimento.
Com a constituição da nova Central Sindical
Popular Conlutas (CSP Conlutas) em 2010, o MML passa a preparar o I
Encontro das Mulheres da CSP Conlutas, para 2012, e assume a
responsabilidade de organizar as mulheres da central, o que implicava em conquistar
as entidades de base, envolvendo mais e mais as trabalhadoras na luta.
Em Carta aprovada durante o I Encontro das Mulheres da CSP Conlutas,
o MML afirmava a necessidade de
incorporar as demandas das mulheres trabalhadoras como parte da luta e atuação
cotidiana do movimento sindical e popular.
As bandeiras do MML eram:
aumento geral dos salários;Salário Igual
para Trabalho Igual!; garantia de atenção integral à gestante no parto e
pré-natal; licença-maternidade de 6 meses sem isenção fiscal, para todas as
trabalhadoras e estudantes, rumo a um ano!; reconhecimento do atestado de
acompanhamento dos filhos como abono de dias ao trabalho!; creches em tempo
integral, gratuitas e de qualidade para todos os filhos da classe trabalhadora!;
anticoncepcionais para não abortar, aborto legal, seguro e gratuito para não
morrer!; revogação imediata da MP 557/2011, que criminaliza as mulheres!; pela
autonomia sobre o próprio corpo, contra a exigência de autorização do marido
para realização de “ligadura”; Fim da Violência contra a mulher! Aplicação e
Ampliação da Lei Maria da Penha! Punição dos Agressores, construção de
casas-abrigo!; cotas raciais nas universidades; criminalização da homofobia; fim
da terceirização que afeta principalmente as mulheres; em defesa da previdência
pública e das mulheres aposentadas.
O MML também defendia a realização de
campanhas que visassem à inclusão das datas históricas das mulheres no calendário
da CSP Conlutas, tais como o 8 de março – dia internacional de luta das
mulheres trabalhadoras; o 25 de julho – dia latino-americano da mulher negra; o
28 de setembro - dia latino americano de luta pela legalização e
descriminalização do aborto; 25 de novembro - dia latino americano de luta
contra a violência às mulheres. Ademais, caberia à CSP Conlutas assumir as
campanhas “Trabalho Igual, Salário Igual” e
a “Campanha Nacional por Creches”.
A ênfase na centralidade político-organizativa
da CSP Conlutas, em torno dos temas
relacionados às lutas das mulheres, deve ser entendida como um processo de
“politização” das mulheres, mas também dos homens, no interior da própria
central. Embora se filie a uma central sindical e popular de esquerda e classista,
hegemonizada por sindicatos de setores da educação e saúde - majoritariamente
femininos -, o MML entendia que o
avanço da pauta das mulheres dependia – e depende - de um processo de
politização. Dito de outro modo, a posição de esquerda socialista no espectro
sindical de um lado e de central protagonizada por importantes sindicatos
majoritariamente femininos, de outro, não era, por si só, garantia de avanço da
pauta feminina.
Neste
sentido, o MML propunha a criação
de secretarias de mulheres nos sindicatos, o estabelecimento de cotas para as
mulheres nas diretorias das entidades, o desenvolvimento de ações organizativas
por local de trabalho e nas CIPAS, a realização de campanhas de sindicalização
voltadas às mulheres e de novos encontros de mulheres que deliberassem sobre as
pautas relativas à opressão.
Em 2013 o MML realiza o I Encontro Nacional das Mulheres em Luta.
Este Encontro contou com duas mil participantes e ocorreu logo após as
manifestações de junho. Ao realizar um balanço de sua trajetória, o MML reconhece
as conquistas e avanços junto às organizações nos estados, construindo
encontros e plenárias regionais e se consolidando como importante instrumento
para avançar o trabalho dos
sindicatos em relação à luta pelos direitos das mulheres trabalhadoras.
(...)feito através de campanhas, como a luta por creches, que organizou
trabalhadoras em vários locais de trabalho, ao mesmo tempo em que denunciou o
atraso no projeto inicial do governo Dilma em construir creches (...)Agora
estamos avançando para, junto com as campanhas por creches, avançar numa grande
campanha contra a violência às mulheres.[5]
Um dos principais eixos de
luta definidos durante o I Encontro Nacional do Movimento de
Mulheres em Luta era
justamente o incremento da pauta das mulheres nos movimentos e protestos
sociais. Deveriam ser organizadas campanhas contra a violência, contra a
privatização da Petrobras, pelo fim da terceirização e privatização, contra o
PL 4330, lutando para que as terceirizadas tivessem direito iguais aos demais
trabalhadores.
Ademais no âmbito sindical
deveriam ser realizadas campanhas salariais, destacando as demandas específicas
das mulheres, tais como salário igual, creches integrais nos locais de
trabalho, direito à progressão na carreira, contra o assédio moral entre outras
pautas. Além destas campanhas o MML deveria fortalecer a luta pela legalização
do aborto, participando da Frente Nacional pela Legalização do Aborto, da
campanha Fora Feliciano e da aprovação do PL 122, que criminaliza a homofobia; seguir
a campanha por creches públicas gratuitas e tempo integral para todos os ramos
da classe trabalhadora.
Patrícia
Vieira Trópia, professora adjunta do Instituto de Ciências Sociais da
Universidade Federal de Uberlândia.
Priscila
Souza de Carvalho, mestranda em Ciência Política pela Universidade Federal de
Uberlândia.
Bibliografia
CARVALHO, P. S. O neoliberalismo confrontado:
um estudo sobre as concepções e a experiência da Conlutas na organização da
classe trabalhadora. Uberlândia, Monografia de Graduação em Ciências Sociais. Universidade
Federal de Uberlândia, 2012, mímeo.
CSP - Conlutas
“1° Encontro de Mulheres da CSP-Conlutas reúne mais de 500 pessoas e elege sete
delegadas para o Congresso” 27/04/2012. Disponível em: http://cspconlutas.org.br/2012/04/1-encontro-de-mulheres-da-csp-conlutas-reune-mais-de-500-pessoas-e-elege-sete-delegadas-para-o-congresso/#sthash.u4EDhBrP.dpuf. Acessado em 30/09/2014.
GALVÃO,
Andréia. TRÓPIA, Patrícia Vieira. A Conlutas em Perspectiva. IN: O sindicalismo
na Era Lula: paradoxos, perspectivas e olhares. Roberto Véras de Oliveira,
Maria Aparecida Bridi, Marcos Ferraz (orgs.). Belo Horizonte, Fino Traço, 2014, p. 115- 148.
MOVIMENTO DE MULHERES EM LUTA. 1o. Encontro
de Mulheres da Conlutas: um passo importante para a luta das mulheres
trabalhadoras. 2008. Disponível em http://www.lsr-cit.org/mulheres/30-mulheres/384-1o-encontro-de-mulheres-da-conlutas-um-passo-importante-para-a-luta-das-mulheres-trabalhadoras. Acesso em 03 set. 2014
MOVIMENTO DE MULHERES EM LUTA. 2012. Disponível em: http://mulheresemluta.blogspot.com.br/p/historia-do-mml.html. Acesso em: 03 de set. de 2014.
TRÓPIA, Patrícia Vieira. GALVÃO, Andréia. MARCELINO,
Paula. “A reconfiguração do sindicalismo brasileiro nos anos 2000: as bases
sociais e o perfil político-ideológico da Conlutas”. Revista Opinião Pública, Campinas, vol. 19, nº 1, p. 81-117, Jun.,
2013.
[3]Embora a
chegada de Dilma Rousseff ao poder represente uma conquista importante para as
mulheres, seu governo deixava, na avaliação do MML, a desejar por não ter
vetado a lei que exigia a aplicação de multa às empresas que pagassem salários
inferiores às mulheres que exercessem a mesma função dos homens.
[4]Vale destacar
que durante o CONCLAT a unificação se deu de forma parcial com a retirada do
principal setor da articulação, a Intersindical. Porém o processo de unificação
se manteve, outras entidades aderiram, incluindo o MML.
[5]
Disponível em: <http://mulheresemluta.blogspot.com.br/p/boletins-eletronicos.html>.
Acessado em: 03 Ago. 2014.
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